Diante de tantas fragilidades da Governança, é importante refletirmos como os Conselheiros de Administração podem ser mais efetivos na sua função, através de observações mais acuradas e orientações aos executivos. Compartilho algumas reflexões sobre alguns aspectos de cultura que podem ser alertas aos conselheiros nas suas decisões.
Há alguns anos escrevi com outros colegas conselheiros, na comissão de Mercados de Capitais e Comunicação do IBGC, um artigo sobre um alerta aos conselheiros quanto às políticas de remuneração. Relendo o artigo, ontem, depois do que estamos vendo no caso da Americanas, me dei conta quão atual é o tema. Coloco aqui algumas frases que escrevemos na época e algumas reflexões.
O estabelecimento de uma política que inclua a remuneração variável, mediante a fixação de metas agressivas, muitas vezes impossíveis de serem atingidas e distantes da realidade mercadológica do setor em que a empresa está inserida, tende a gerar práticas fundamentadas em visão de curto prazo, conflito de interesses e comportamentos inadequados, que comprometem a própria organização, seus sócios, clientes, fornecedores e funcionários.
Ser conselheiro de uma organização é uma responsabilidade muito grande, não só por causa do risco do próprio CPF, mas principalmente seu papel no desenvolvimento de uma organização duradoura, justa e que contribua para a sociedade de forma construtiva. Um conselheiro de administração precisa ter em mente que deve ajudar a empresa a buscar um modelo de gestão que motive seus funcionários a quererem trabalhar na organização pelo seu propósito, desenvolvimento pessoal e satisfação no trabalho. Ter um trabalho gratificante num ambiente saudável. E acima de tudo enfatizar uma cultura ética, o dever fiduciário, de lealdade e outras responsabilidades da lei 6.404/76.
A política de remuneração adotada deve ser disponibilizada de forma transparente aos profissionais envolvidos, após validada pelo conselho de administração, de maneira que todos sejam adequadamente informados para que tomem suas decisões de relacionamento comercial ou de investimentos na empresa de forma consciente.
Ora, relendo essas frases, reflito sobre o caso Americanas e o “Sonho Grande” de gerar bons resultados a qualquer preço. “Bons resultados” é muito maior do que resultados financeiros que irão beneficiar no curto prazo, negócio e funcionários. A longevidade da empresa deve ser sempre o foco.
Minha consultoria, Gati Consultoria, é afiliada do Shingo Instituto no Brasil, onde ajudamos as lideranças a enxergar comportamentos para a Excelência Organizacional. O Modelo Shingo é baseado em 10 princípios orientadores, e possui 3 insights para a Excelência, conectados com comportamentos para gerar resultados
Insight #1: Resultados Ideais (KPIs – Key Performance Indicators). Requerem Comportamentos Ideais (KBIs – Key Behavior Indicators).
Insight #2: Propósito e Sistemas Impulsionam Comportamentos.
Insight #3: Princípios Moldam Comportamento Ideal.
Logo, resultado não é só financeiro, é resultado global de KPIs e KBIs. E isso podemos observar não só no resultado de P&L, mas também nas atitudes e comportamentos das pessoas da organização em todos os níveis, principalmente na base da pirâmide.
A base da pirâmide, funcionários da linha de frente, são a maioria dos membros de uma organização. Seus comportamentos e crenças é que definirão a cultura de uma organização. Cultura essa, direcionada pela alta liderança e implementada pelas gerencias.
Portanto, como conselheiro de administração de uma organização, sugiro que não só participe de uma reunião de conselho numa sala fechada, mas fique atento às pesquisas de clima, faça visitas nas áreas operacionais da empresa, faça perguntas durante essas visitas, pergunte se fizeram alguma melhoria no seu trabalho, onde e como fizeram e se tiveram algum reconhecimento e de que forma (financeira e não financeira). Com isso, irá observar a motivação das pessoas, a coerência do discurso na organização, como buscam as metas definidas na organização, além do orgulho de pertencer. Procure entender como as pessoas fazem seu trabalho, se as lideranças estão presentes, se interagem com as pessoas nos menores níveis da organização. Se as lideranças demonstram humildade para ouvir e apoiar as melhorias de forma ativa, a fim de promover o desenvolvimento das pessoas e crescimento do negócio de forma duradoura.
Enfim, a responsabilidade do conselheiro de administração vai muito além de resultados financeiros. Um conselheiro de administração tem vivência, experiência e conhecimentos que a gestão não tem. E devem estar atualizados sobre modelos de remuneração e incentivos que o mercado tem praticado e impactos dessas escolhas na organização em questão.
Publicado em:
https://pensamentocorporativo.com/pensamentos_corporativos_04_2022_742/
https://www.linkedin.com/pulse/os-conselheiros-de-administra%25C3%25A7%25C3%25A3o-e-o-seu-papel-na-uma-ana?trackingId=IzRpSwQcSJqKW%2FgPZ2gdsw%3D%3D&lipi=urn%3Ali%3Apage%3Ad_flagship3_profile_view_base_recent_activity_content_view%3B6U%2F0oC7eT%2FCHwRJFneo5Pg%3D%3D